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A review by fevi
A palavra que resta by Stênio Gardel
emotional
reflective
sad
tense
fast-paced
4.5
Em "A palavra que resta" acompanhamos a vida de Raimundo. Um senhor que na juventude teve um grande amor, Cícero. No entanto, esse amor foi destruído pelos pais dos jovens por não aceitarem e acharem certo um homem apaixonar-se por outro homem. Antes dos desencontros, Cícero pediu para Marcinha, irmã de Raimundo, entregar uma carta para que amava. Mas Raimundo não sabia ler e não permitia que nenhuma outra pessoa lesse a carta para ele. Já mais velho enquanto entra na escola para aprender a ler e escrever e assim poder desvendar a carta que Cícero lhe escreveu, Raimundo Gaudêncio relembra a sua história de vida.
Eu já havia tido contato com a escrita de Stênio Gardel há alguns anos pelo conto que ele escreveu para uma coletânea dos alunos da oficina de escrita de Socorro Acioli. Era um conto sobre uma prostituta. Era meio confuso e difícil de entender, mas tinha chamado a minha atenção. Em A palavra que resta o encanto foi arrebatador e imediato. A poética de Gardel e a sua forma de narrar me conquistaram e transformaram a leitura em um momento de prazer mesmo com tanto sofrimento.
Gardel não faz uma literatura polida e fácil para conquistar leitores. Ele usa do seu diferencial para narrar violências cruéis e impactantes. Violências que não estão longe do nosso cotidiano. Não é apenas ficção quando lemos em jornais que pais matam filho por achá-lo afeminado, quando o Brasil é o país que mais mata mulheres transexuais e travestis, quando lésbicas e gays sofrem violência em casa e na rua por serem quem são e todo tipo de apagamento que a comunidade LGBTQIA+ sofre. O autor não descreve atos violentos apenas para chocar. Esses momentos estão ali para nos fazer refletir sobre como a sociedade age diante da diferença e insistentemente perpetua a homofobia por gerações. O que estamos fazendo de errado? Além de mostrar como tudo isso afeta diretamente as vítimas e suas vivências.
A homofobia violenta e escancarada está por todo o livro. No entanto, acredito que este livro não é apenas sobre violência. É também sobre amor, perdão e a possibilidade de renascer. Acreditar que o que te faz diferente não é ser sinônimo de monstruosidade ou pecado. É apenas mais um detalhe. A palavra que resta não é sobre a carta que Cícero mandou para o homem que amava. É sobre o renascimento de Raimundo Gaudêncio que apesar de toda violência que sofreu, de toda homofobia e transfobia que perpetuou, ele conseguiu se livrar das amarras impostas pela sociedade. O desejo dela de vê-lo morto ou escondido foi superado. Mas é também uma história sobre como nem sempre o amor consegue superar o mal a sociedade impõe como norma. No entanto, há outros caminhos para podermos trilhar e descobrir nova forma de amar e ser amado.
Quanto à carta é preciso entender que Raimundo nunca quis que outras pessoas lessem ou soubessem o que ali estava escrito. Ele não queria observadores bisbilhotando seu amor e sua dor. Aquelas palavras pertenciam somente a ele. As palavras que restavam para entender o que havia feito da vida teriam apenas um remetente. Nós leitores não estávamos inclusos, somente Gaudêncio.
Eu não esperava ficar tão impactado com essa história, ter chorado tanto. Mas fico imensamente feliz de ter lido. O mundo é cruel e é importante ter a literatura para nos ajudar a refletir sobre essas crueldades e imaginar e agir para uma vivência diferente. Super recomendo e indico.
Eu já havia tido contato com a escrita de Stênio Gardel há alguns anos pelo conto que ele escreveu para uma coletânea dos alunos da oficina de escrita de Socorro Acioli. Era um conto sobre uma prostituta. Era meio confuso e difícil de entender, mas tinha chamado a minha atenção. Em A palavra que resta o encanto foi arrebatador e imediato. A poética de Gardel e a sua forma de narrar me conquistaram e transformaram a leitura em um momento de prazer mesmo com tanto sofrimento.
Gardel não faz uma literatura polida e fácil para conquistar leitores. Ele usa do seu diferencial para narrar violências cruéis e impactantes. Violências que não estão longe do nosso cotidiano. Não é apenas ficção quando lemos em jornais que pais matam filho por achá-lo afeminado, quando o Brasil é o país que mais mata mulheres transexuais e travestis, quando lésbicas e gays sofrem violência em casa e na rua por serem quem são e todo tipo de apagamento que a comunidade LGBTQIA+ sofre. O autor não descreve atos violentos apenas para chocar. Esses momentos estão ali para nos fazer refletir sobre como a sociedade age diante da diferença e insistentemente perpetua a homofobia por gerações. O que estamos fazendo de errado? Além de mostrar como tudo isso afeta diretamente as vítimas e suas vivências.
A homofobia violenta e escancarada está por todo o livro. No entanto, acredito que este livro não é apenas sobre violência. É também sobre amor, perdão e a possibilidade de renascer. Acreditar que o que te faz diferente não é ser sinônimo de monstruosidade ou pecado. É apenas mais um detalhe. A palavra que resta não é sobre a carta que Cícero mandou para o homem que amava. É sobre o renascimento de Raimundo Gaudêncio que apesar de toda violência que sofreu, de toda homofobia e transfobia que perpetuou, ele conseguiu se livrar das amarras impostas pela sociedade. O desejo dela de vê-lo morto ou escondido foi superado. Mas é também uma história sobre como nem sempre o amor consegue superar o mal a sociedade impõe como norma. No entanto, há outros caminhos para podermos trilhar e descobrir nova forma de amar e ser amado.
Quanto à carta é preciso entender que Raimundo nunca quis que outras pessoas lessem ou soubessem o que ali estava escrito. Ele não queria observadores bisbilhotando seu amor e sua dor. Aquelas palavras pertenciam somente a ele. As palavras que restavam para entender o que havia feito da vida teriam apenas um remetente. Nós leitores não estávamos inclusos, somente Gaudêncio.
Eu não esperava ficar tão impactado com essa história, ter chorado tanto. Mas fico imensamente feliz de ter lido. O mundo é cruel e é importante ter a literatura para nos ajudar a refletir sobre essas crueldades e imaginar e agir para uma vivência diferente. Super recomendo e indico.